terça-feira, 29 de junho de 2010

Marble Halls - (Enya)


Enya Marble Halls from Enya 's Shepherd Moons Album.

terça-feira, 22 de junho de 2010

O retiro e a verdade - (Monja Coen)


"Acordávamos antes dos pássaros. Os insetos chilreavam enquanto nos sentávamos em meditação. No silêncio de nossas bocas, ouvíamos o primeiro piar anunciando a manhã. Assim passávamos os dias. De meditação em meditação, silêncio e orações. Plena atenção aos gestos, passos, olhos baixos. Havia dor. A dor do corpo não acostumado a tantas horas na mesma posição e a dor da tristeza, da saudade, da incerteza, da culpa.

Havia a dúvida. Havia o medo de perder a razão. Como se perde a razão? Primeiro, seria de bom senso encontrá-la. O que é a razão? Eu tenho razão? Ele tem razão? Estaria ela com a razão? Que arrazoado é esse?

Em um vitral da sala em que meditávamos, estava escrito: "Não há religião superior à verdade". Era o que nós tentávamos encontrar, a verdade. Verdade sobre nós mesmos. Será que nos enganamos, nos iludimos e logo nos desiludimos? Será que esquecemos a verdade em um baú trancado em um sótão antigo, cujas escadas rangem e nos assustam a cada passo? Mas ela deveria ser clara e luminosa, afastando a ignorância, a ganância, a raiva, o rancor. Por que nos apavora tanto encontrar o que mais procuramos? Por que evitamos e nos escondemos, como se fosse possível a verdade se esconder da verdade? Afinal, não somos todos verdadeiros? De tempos em tempos, eu lia textos medievais, do século 13. Eram textos modernos, atuais, até futuristas. Um deles dizia que o universo é uma jóia arredondada e que não há nada fora dele.

É impossível jogar qualquer coisa fora, pois o fora não existe. Tudo está incluído e se transformando a cada instante.

Esperando o momento de me levantar, com as pernas doendo, contando cada inspiração, eu me esquecia de meu propósito e de minha busca. Parece tão simples e é tão difícil. Poucos conseguem, bem poucos se interessam. Queremos sempre ser entretidos. Gostamos de entretenimento. Pode ser televisão, filme, música, teatro, leitura. Podem ser encontros, festas, conversas. Podem ser amores e desamores, afetos e desafetos, brigas, ciúmes, inveja.

Outro dia, alguém me disse que ciúme e inveja são diferentes. O arrazoado era assim: o ciumento é egoísta, mas ama e protege. O invejoso quer destruir, não quer que exista, quer ser o outro e faz qualquer coisa para apagar o invejado da cena. Perigoso.

Perceba suas emoções, seus pensamentos, sensações. Discernimento é uma palavra que os padres e as monjas gostam muito. Responsabilidade. Escolha.

À noite, antes de ir dormir, antes do último e delicioso toque do sino, que nos permitia levantar, com voz lenta e dramática foi declamado: "Vida e morte são de suprema importância. O tempo rapidamente se esvai e a oportunidade se perde. Cada um de nós deve se esforçar para acordar, para despertar. Não desperdice a sua vida".

Saíamos da sala em silêncio. Alguns ouvindo tudo, outros, nada. Mas a verdade incessante não deixava de ser proclamada. Está sempre em toda a parte e, no entanto, sem abrir o olho da sabedoria, nada entendemos. "Somos a vida do Universo em constante transformação", outra fase medieval. Como é que eles sabiam? Hoje nós sabemos, falamos em Geia, a Terra viva e palpitante, árvores e metais, fogo e ar, seres vivos, plantas.

Quem sou eu? Quem é você? Sou o nada, sou o tudo, sou o todo. Sou a Terra e o Universo em expansão. Sou a borboleta e o orvalho. Sou o silêncio e o turbilhão da mente. Pelas ruelas vazias caminhávamos em fila indiana, sentindo a brisa, as cores, os odores, as texturas dos ventos, as luzes e as sombras. Nós fazíamos parte do todo. O retiro acabou e nos despedimos. Cada um de nós levou aquilo que pôde apanhar ou o que soube largar. (Homenagem à Semana da Iluminação de Buda)"




Fonte: Revista da Hora, 14 de dezembro de 2003

A relação entre mestre e discípulo - (Osho)


“Querido Osho,

Sinto um amor carinhoso quando estou na sua presença, mas percebo que quando não estou próximo a você, não é do mesmo jeito. É verdade que espaço e tempo não fazem qualquer diferença na grande relação entre mestre e discípulo?

Deva Suria, é sempre verdade que espaço e tempo não fazem qualquer diferença na grande relação amorosa entre discípulo e mestre. Não que em algumas vezes seja verdade e em outras, não. Essa questão é eterna. Mas, na experiência real, particularmente no começo, o amor do discípulo ainda não é tão puro; ainda existem expectativas. Não é um amor sem desejos; ele está poluído por muitas coisas.

Por causa dessa poluição de desejos e expectativas, tem-se a impressão que espaço e tempo fazem alguma diferença. Eles não fazem diferença no que se refere ao amor, mas o seu amor não é apenas amor; ele tem muitas outras coisas envolvidas. Mesmo a expectativa da iluminação é suficiente para destruir a sua pureza.

O princípio se aplica ao amor puro, ao amor que é simplesmente feliz sem que haja qualquer motivo, ao amor que já juntou a dança do mestre ao coração. Então, o mestre não está mais fora, você o carrega dentro de si, onde quer que esteja. É por isto que espaço e tempo não fazem qualquer diferença. Mas se o mestre ainda estiver do lado de fora, como um objeto de amor, então o espaço fará diferença, o tempo fará diferença. A diferença vem através das impurezas e elas são quase inevitáveis no começo, porque você não consegue pensar que o desejo pela iluminação seja uma impureza.

De fato, para você, a grande relação amorosa entre o mestre e o discípulo está acontecendo somente por causa de seu anseio pela iluminação. Naturalmente, quando você está próximo, você sente mais confiança. Quanto mais próximo estiver, mais você sentirá a presença do mestre. Quanto mais longe você for, mais a sua confiança começará a estremecer porque o mestre ainda é apenas um meio para se chegar a um certo fim.

Quando Gautama Buda morreu, havia dez mil discípulos que sempre o seguiam em suas longas jornadas. Naquela grande multidão de discípulos, havia pessoas como Sariputta, Maudgalyan, Mahakashyapa, Manjushri, Vimal Kirti e muitos outros que já tinham se tornado iluminados, que já haviam cruzado a barreira entre o mestre e o discípulo, que já haviam entrado no mundo da devoção.

Quando Gautama Buda morreu foi um grande choque para todo mundo, mesmo para o seu discípulo mais próximo, Ananda, que desatou a chorar. Ele era mais velho que Gautama Buda. Buda tinha oitenta e dois anos e Ananda, cerca de oitenta e cinco ou mais. Ele desatou a chorar como uma criança que perdeu a mãe. Mas Manjushri, Vimal Kirti e Sariputta permaneceram completamente silenciosos, como se nada estivesse acontecendo, ou se o que estivesse acontecendo não lhes dissesse respeito.

Muitos discípulos ficaram chocados com a frieza de Sariputta e dos outros; eles não conseguiam entender. Eles podiam entender o Ananda desatando a chorar. Na verdade, eles pensavam que Ananda era o mais íntimo. Enquanto Sariputta, Maudgalyan e Mahakashyapa permaneciam sentados em silêncio.As pessoas lhes perguntavam, ‘Por que vocês estão em silêncio, enquando Ananda está chorando?’

Sariputta respondeu, ‘Porque para mim, meu mestre nunca pode morrer. A morte não consegue nos separar. Ele apenas deixou o seu corpo, mas ele continua aqui; meu coração ainda está sentindo a sua presença, na verdade, sentindo mais do que nunca.’

E as respostas dos outros discípulos iluminados foram as mesmas, sem uma simples lágrima em seus olhos. Eles não eram duros nem frios. Eles simplesmente já tinham cruzado a barreira entre mestre e discípulo. Ou você pode dizer que eles entraram na consciência do mestre, ou eles permitiram que a consciência do mestre entrasse neles, o que quer dizer a mesma coisa: os dois desapareceram e agora existe apenas um.

O entendimento das pessoas estava absolutamente errado que Ananda devia ter amado mais o mestre, porque ele havia desatado a chorar. Perguntado, ele disse, ‘Eu estou chorando porque enquanto ele estava vivo, por quarenta e dois anos eu fui o seu discípulo mais íntimo, intimidade no sentido de que eu estava sempre com ele. Nestes quarenta e dois anos, nem por um simples dia eu me separei dele, mesmo à noite eu costumava dormir em seu quarto, só para estar presente, no caso dele precisar de algo. Eu não estou chorando porque eu era o mais íntimo; eu choro porque mesmo com essa prolongada intimidade, eu permaneci separado dele. Alguma coisa permanecia como uma barreira.’

Gautama Buda não estava morto ainda. Ele apenas tinha fechado os olhos e estava relaxando no eterno.Ele voltou, abriu os olhos e disse ao Ananda, ‘Não se preocupe. Era a minha presença e o seu amor para comigo que era a barreira, porque o seu amor tinha uma motivação. Você queria tornar-se iluminado antes de todos, e você sempre tinha uma inveja escondida quando os outros alcançavam o seu potencial, chegando à própria fonte. No fundo você se sentia machucado, porque você estava muito próximo, mas eram os outros que estavam se tornando iluminados antes de você. Você não conseguia alegrar-se com a iluminação deles. Você poderia ter se alegrado, poderia ter celebrado, mas o foco de sua mente era a sua própria iluminação, era muito você. E a sua inconsciência continuou desde o primeiro dia, preso à idéia de que você é meu primo-irmão, meu irmão mais velho. Ainda que desde o primeiro dia você não tenha mais mencionado isso, a memória piscológica estava ali. Conscientemente, deliberadamente você tornou-se um discípulo, mas inconscientemente você sempre sabia que era o meu irmão mais velho; você não conseguiu dissolver-se em mim. Mas não chore, vinte e quatro horas após o momento em que eu morrer, você se tornará iluminado. Sem a minha morte, você não consegue tornar-se iluminado.’

Ananda ainda não conseguia consolar-se. Ele disse, ‘Depois de vinte quatro horas você não estará aqui. Para quem eu irei perguntar se eu me tornei iluminado ou não? E, na eternidade do tempo, eu não sei quando eu encontrarei um homem como você, com uma consciência tão grande e vasta.’
Buda lhe disse, ‘Não se preocupe, isso vai acontecer. Eu estava observando continuamente. Eu mesmo estava intrigado porque não estava acontecendo com você. Você queria tanto.’

E esse é o problema: deseje demais a iluminação e você a perderá, retenha em algum lugar do seu inconsciente o desejo de alcançá-la e você não alcançará.

Relaxando, esquecendo tudo sobre iluminação, esquecendo tudo sobre o futuro, vivendo no presente, o seu amor atingirá uma pureza clara e cristalina, não poluída por qualquer desejo, nem mesmo o desejo maior pela iluminação.
Então você não sentirá a distinção entre o mestre e você mesmo, e carregará o mestre dentro do seu coração. Então, onde quer que você esteja, o mestre estará com você. A dualidade será deixada de lado; as duas chamas se tornarão uma. Não é a sua chama e não é a chama do mestre. Quando aquelas duas chamas se tornam uma, elas se tornam universal. Na separação, você é um discípulo e existe um mestre. Tornando-se um, o discípulo desaparece e o mestre desaparece; o que permanece é apenas a pura consciência.

A transformação do amor em pura consciência é a alquimia a ser aprendida quando se está próximo de um mestre. Estando próximo de um mestre, você pode desfrutar de seu carinho, da sua presença, das suas palavras, da batida de seu coração. Mas quando você se afasta, você não é capaz de ouvir a mesma batida do coração, você volta de novo à estaca zero. Você ouvirá a batida do coração, mas será do seu próprio coração. Próximo ao mestre você está sob a sua influência.

O segredo do aprendizado é a purificação de seu amor.
Abandone todas as ambições.
Nada há para ser alcançado.

Tudo que você deseja já está presente em você. O mestre não vai lhe dar algo que você ainda não tenha. Na verdade, o mestre continua tirando coisas que você pensa que tem, mas que não tem. E o mestre não pode, naturalmente, dar-lhe aquilo que você já tem. Ele só consegue retirar todas as barreiras, todos os estorvos, todos os obstáculos, de modo que só permaneça aquilo que lhe é próprio. Em tal espaço não poluído, a distinção entre o mestre e o discípulo deixa de existir. Isto não significa que você não se sinta agradecido ao mestre. Na verdade, somente depois que isto tenha acontecido, você sentirá pela primeira vez, uma tremenda gratidão.

Sariputta estava muito relutante em partir para espalhar a mensagem. Buda pediu-lhe para ir ao seu próprio reino. Ele era um príncipe, antes de se tornar um discípulo. Buda disse, ‘Agora é sua responsabilidade e sua compaixão ir até o seu povo: ao seu pai, sua mãe, a todo seu reino. Deixe que eles fiquem cientes do que você alcançou. Compartilhe, eles também têm o potencial.’

Ele estava muito relutante para partir. Buda disse, ‘Qual é a relutância? Agora eu estou dentro de você. Eu estou enviando-o para longe, sabendo perfeitamente bem que você não sentirá qualquer distância.’

Sariputta disse, ‘A distância não é o problema. Eu posso ir até a estrela mais distante e você ainda estará dentro do meu coração. O problema é que, estando aqui, eu toco os seus pés todos os dias. Você poderá estar em meu coração, mas como eu vou tocar os seus pés?’

Gautama Buda disse, ‘Você é um ser iluminado. Você não tem que tocar os meus pés.’

Sariputta disse, ‘Antes da iluminação, isto era um ritual. Eu tocava os seus pés apenas porque todo discípulo estava tocando. Mas agora não é mais um ritual. Agora é autêntica gratidão, porque sem você, eu não teria alcançado a mim mesmo. Embora isto estivesse sempre dentro de mim, eu não acho que sozinho seria capaz dessa descoberta, pelo menos, não nesta vida. A sua compaixão, o seu amor, as bênçãos que continuamente você derramou sobre mim, pouco a pouco, removeram tudo aquilo que não era eu mesmo. Agora, quando eu toco os seus pés, não é um ritual, é um alimento do coração. Eu me sinto nutrido. No dia em que eu deixo de tocar-lhe os pés, sinto um vazio. E sei que você está dentro de mim.’

Buda disse, ‘Todos vocês que se tornaram iluminados terão que aprender a estar longe de mim, e ao mesmo tempo não estarem longe de mim. É verdade que vocês não conseguirão tocar os meus pés, mas, de onde vocês estiverem, simplesmente se voltem para o lado onde vocês acham que eu estou e curvem-se até a terra. O meu corpo pertence à terra. Se vocês tocarem a terra com a mesma gratidão, estarão tocando a mim.’

Sariputta partiu. E as pessoas de seu reino não conseguiam acreditar; ele havia alcançado uma grande glória, uma grande magnificência, uma grande beleza. Tudo isto era milagroso, mas a curiosidade deles era porque todos os dias, pela manhã e ao anoitecer ele se voltava para a direção onde, longe, Buda estava morando, e tocava a terra com tremenda gratidão.

Eles diziam, ‘Você é um ser iluminado, não tem que tocar a terra.’

Ele dizia, 'Eu não estou tocando a terra. Aprendi um novo segredo, que o corpo nada mais é do que terra, e que ela contém não apenas os pés do meu Buda, meu mestre, mas todos os budas do passado, do presente e do futuro. Tocando-a, eu toco todos aqueles que tornaram-se despertos e fizeram com que o caminho ficasse claro para mim, mostraram-me o caminho.’

Mesmo depois que Buda morreu, ele continuou curvando-se, voltado para a mesma direção onde estava o corpo de Buda em seus últimos momentos. Ele nunca sentiu qualquer separação. E isto não foi apenas com ele, mas com todos os vinte e quatro discípulos que haviam se iluminado.

Ananda iluminou-se, conforme Buda predisse, vinte quatro horas após ele deixar o corpo. Na verdade, ele nem se moveu do lugar. Quando Buda morreu, ele fechou os olhos e permaneceu sem comer, sem beber, sem dormir. Aquelas vinte e quatro horas foram o tempo mais importante de sua vida, um tempo de transformação de um ser ignorante em uma alma desperta. Ele somente abriu os olhos quando as lágrimas haviam desaparecido e um sorriso havia brotado em seu rosto.

Manjushri estava próximo e disse, ‘O que aconteceu? Você esteve chorando, esteve sentado como se estivesse morto, e, de repente, você está rindo’.

Ananda disse, ‘Eu estou rindo porque a sua predição provou estar certa. O obstáculo era a impureza de meu amor. E agora que ele se foi, não há mais razão para sentir-me como seu irmão mais velho, para sentir qualquer apego. Em sua pira funerária, na medida em que o seu corpo desaparecia na fumaça, todos os meus apegos também desapareciam.’

Não será necessário, Suria, que eu tenha que estar numa pira funerária para você se tornar iluminada. Pode ser assim, se você precisar. Um dia eu estarei lá, mas será muito mais bonito se no dia em que eu estiver numa pira funerária, você estiver sem lágrimas. Quando eu desaparecer do corpo, você saberá que eu tornei-me mais profundamente envolvido dentro de você e dentro de toda a existência.”

Entre o céu e o inferno - Como tratar os animais? - (Rodrigo Vergara)


O homem convive com os animais desde quando ainda tinha a sensação de que era um deles. Ao longo dos anos, já os adoramos como deuses e já os maltratamos como se fossem coisas. Hoje, enquanto várias pessoas pregam que devemos nos isolar dos bichos, outras acreditam que deveríamos tratá-los como membros da família. Afinal, como conviver com eles?

O cachorro é todo marrom, da cauda às longas orelhas, a não ser por uma mancha sobre o olho esquerdo. Se fosse um bicho de estimação, podia ser batizado de Pirata ou Camões, por causa do tapa-olho. Mas esse cachorro não tem nome. Nascido há semanas, ele foi logo separado da mãe e passa a vida em uma jaula pouco maior que seu corpo. Sem ter o que fazer, ele come e dorme. Rapidamente engorda. Um dia, ele é enfiado em uma gaiola com outros cães e levado a um galpão. O cheiro de sangue e fezes é forte. Ouvem-se ganidos. Uma pessoa se aproxima e lhe aplica um choque violento. Em instantes, o cão sem nome morre. Seu corpo é jogado sobre uma grelha e seu pêlo, tostado. Em alguns minutos ele é cortado em pedaços para virar churrasco.

A cena descrita acima é real e acontece diariamente na Coréia, onde carne de cachorro é muito apreciada. Fora dali, porém, o abate de cães é considerado uma afronta, uma ofensa aos padrões civilizados. Não deixa de ser curioso, já que porcos, vacas e galinhas têm destinos bem parecidos com o do anônimo cão coreano, mas bem pouca gente ergue a voz para protegê-los.
O fato de aceitarmos que alguns animais sejam torturados enquanto enchemos outros de cuidados reflete a confusão que fizemos com os seres de outras espécies. Por um lado, nunca houve tanta preocupação com a vida dos bichos. Por outro, nunca tantos sofreram e morreram por nossa culpa. Em um ano, a indústria de artigos para animais de estimação fatura 30 bilhões de dólares nos Estados Unidos vendendo conforto para bichos domésticos. No mesmo prazo, oito bilhões de frangos são atormentados e mortos por lá. E na mesma Alemanha em que, no ano passado, os animais ganharam um direito constitucional – a lei agora obriga o Estado a respeitar e proteger a dignidade dos homens "e dos animais" – , a carne de porco ainda é a base protéica da população e os suínos vivem confinados a maior parte da vida.

Não é fácil entender como chegamos a essa confusão cultural. Conhecer o passado ajuda a esclarecer as coisas.

Uma relação antiga
O homem come carne de outras espécies há quase 2,5 milhões de anos e já faz mais de 6 mil anos que os criamos, com o único propósito de digeri-los ou vestir sua pele. Curiosamente, muitos deuses dos povos primitivos eram animais. Então o homem primitivo matava seus deuses? Isso mesmo. "O caráter sagrado do animal pode ser visto como um pedido de desculpas, uma solicitação de autorização ou uma compensação, uma homenagem pela sua morte", diz Antonio Fernandes Nascimento Júnior, antropólogo e etólogo (que estuda o comportamento animal) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Bauru. Em outras palavras, os caçadores podiam matar o bicho, desde que depois rezassem para ele ou por ele. Pecado era faltar com o respeito. "Tratá-los sem o devido respeito poderia causar vinganças dos deuses." Alguns povos exigiam que o animal a ser degolado concordasse com sua morte, o que se conseguia com alguma trapaça, para a qual todo mundo fazia vista grossa.
Na Grécia, os sacerdotes derramavam água benta sobre a cabeça do animal. Os gregos espertamente entendiam o chacoalhão de cabeça que ele dava para se secar como um "sim".

Hoje em dia, ninguém reza ao deus-chester no almoço de domingo, graças às religiões monoteístas (judaísmo, cristianismo e islamismo), que retiraram os poderes mágicos do mundo real e os concentraram em Deus. E é Dele, o Todo-poderoso, que vem a autorização para desfrutarmos dos outros seres. Está na Bíblia: o Jardim do Éden é um paraíso preparado para o homem no qual temos o domínio sobre todas as coisas vivas. A natureza passou a ser como uma massa virgem, pronta para ser moldada e dominada. "Há poucos séculos, a idéia de resistir à agricultura, ao invés de estimulá-la, pareceria ininteligível", escreve o historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural. "A agricultura estava para a terra como o cozimento estava para a carne crua. Terra não cultivada significava homens incultos", diz ele.

Sem seus poderes, a natureza ficou à mercê do ser humano, que se aperfeiçoou em explorá-la. O respeito do passado deu lugar a uma visão utilitária, ou seja, tudo o que servia ao ser humano estava liberado. Matar bichos por prazer já não chocava ninguém, mesmo porque todo mundo praticava alguma tortura de animais. Keith Thomas dá muitos exemplos dessas crueldades. Um deles: donas-de-casa do século 17 cortavam as pernas de aves vivas, acreditando que isso deixava a carne mais tenra. Açular um touro significa atiçar cães contra ele. Há cerca de 350 anos, acreditava-se que o açulamento melhorava o sabor da carne do touro e a maioria das cidades inglesas tinha uma lei que não só permitia o açulamento antes do abate, como o tornava obrigatório.

A visão que se tinha da natureza era antropocêntrica. Os animais eram classificados em comestíveis e não-comestíveis, ferozes e mansos, úteis e não-úteis. O reino vegetal era loteado de forma parecida. Só em 1500 surgiram os primeiros naturalistas, que passaram a classificar os seres por suas caraterísticas e não pela relação que tinham conosco.



Somos iguais, diz a ciência
Não é segredo que a ciência desbancou a religião no papel de intérprete do mundo natural. E a ciência diz que a Terra não é um jardim dado de presente por Deus à humanidade, cheio de bichinhos para desfrutarmos como quisermos. Na versão científica, a vida evoluiu por tentativa e erro, gerando desde bactérias até os mamíferos e o homem. Aos poucos, foram caindo as barreiras que nos diferenciavam das bestas. Percebeu-se que nossos corpos e os dos animais eram muito parecidos, que eles também tinham linguagem, embora mais rudimentar, e que podiam raciocinar. Aristóteles dizia que o homem era o único animal político, mas os primatologistas hoje sabem que os chimpanzés têm uma vida social de digna de uma novela, com favores, amizades e falsidades. Já para Benjamin Franklin, o homem era o único animal que fabrica utensílios, mas primatas não só fazem suas ferramentas como ensinam os colegas a fabricá-las, gerando uma "cultura animal".

Esse conhecimento científico abriu caminho para a idéia de igualdade entre todas as formas de vida. Em algumas décadas, o oceano que nos separava dos animais virou um córrego. Muitos não gostaram dessa proximidade e procuraram formas de se diferenciar dos bichos. Uma delas foi apelar para uma das poucas diferenças que até hoje se sustenta: a religião. O homem é o único ser com uma alma imortal, ou, em outras palavras, é o único com moral, capaz de discernir o que é certo e o que é errado. "A religião e a moral são tentativas de restringir os aspectos animais da natureza humana, o que Platão chamava de ‘o animal selvagem dentro de nós’", diz Keith Thomas. Não por acaso, o diabo é representado por um bicho. No século 17, isso era uma novidade. Até então, as pessoas pensavam que os animais também sabiam o que era certo ou errado. Bichos que desrespeitassem a lei eram levados a julgamento. O Antigo Testamento previa a pena de morte para animais que matassem pessoas.

Segundo Keith Thomas, houve um caso em que marujos atacados por tubarões vingaram-se dos peixes capturando um cardume e torturando-os.

Outro jeito de se diferenciar dos bichos era pelo comportamento. Foi assim que surgiram os primeiros manuais de etiqueta: para que as pessoas não agissem como animais que eram. Ficar nu, ter cabelos compridos, trabalhar à noite e até nadar eram atitudes condenáveis. Passaram a ser suspeitas também as pessoas que viviam muito próximo dos animais, o que significava quase toda a população da época. Até o final do século 18, mesmo nas cidades apinhadas a família dividia o teto com patos, porcos e cabras. O estábulo era separado do quarto de dormir por uma parede. Não demorou muito e os animais foram expulsos de casa. Como não podiam viver pelas ruas, foram expulsos também das cidades.

A partir de então, tirando os animais de estimação, os bichos só entravam na casa mortos, para serem comidos. Alguns, nem assim. Afinal, são poucos os animais aceitos à mesa, graças a alimentares baseados em costumes antigos, sem critérios científicos. Um desses critérios era a dieta do animal. Não se comiam carnívoros e devoradores de carniça ou excrementos, nem animais de trabalho. Não por acaso, o rosbife inglês popularizou-se ao mesmo tempo que o boi perdeu sua função como animal de tração. Outros critérios eram a semelhança com o homem (que tirou os macacos do cardápio) e o ambiente do bicho: na Inglaterra, rãs, lesmas, cogumelos e ostras eram considerados nojentos. Mas, como diz a mãe para a criança que faz cara feia à mesa: "Tudo é costume". Os franceses comiam pernas de rã revirando os olhos de alegria.

Nessa época, foi tomando corpo uma teoria que acabou servindo de justificativa moral para as pessoas que queriam continuar comendo carne: o mecanicismo. "Para os mecanicistas, os animais e o corpo humano eram apenas máquinas. Mas nós temos mente e, portanto, uma alma separada", diz o filósofo Roberto Romano, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O filósofo francês René Descartes (1595-1650), um dos mais conhecidos mecanicistas, dizia que os sentimentos, como a dor e o sofrimento, moravam na alma. Como animais não têm alma, também não sentem dor. "A explicação cartesiana era uma ótima justificativa para o tratamento que era dado aos animais, porque eliminava a culpa pelas crueldades", afirma Thomas.
A tese de que os animais eram insensíveis perdeu popularidade, mas a atitude que ela incentivou sobrevive até hoje entre gente que lida com animais: vaqueiros que maltratam o gado, cientistas que matam animais à toa. Para a maioria das pessoas, porém, cujo único contato com animais era com seu cachorro ou com seu cavalo (algumas das poucas espécies que ainda eram aceitas nas cidades), a história de que só homem sente dor não colou. Pelo contrário. A multiplicação dos bichos de estimação fez aumentar o sentimentalismo em relação aos animais. As pessoas enxergavam neles cada vez mais traços humanos. Além de dor, eles passaram a ter ataques nervosos, vícios e carências. Aos poucos, o tempo foi apagando as lembranças ruins do trabalho rural e só restou uma nostalgia campestre. De repente, a floresta, antes chamada de "terrível", passou a ser bela.

Até o século 16, matar animais selvagens considerados perigosos ou daninhos rendia recompensa. Menos de 300 anos depois, já havia gente querendo proteger o urso, que estava desaparecendo da Europa.
Para algumas pessoas da cidade, passou a ser intolerável o uso de animais. Qualquer uso, mesmo para comer. Foi o primeiro surto de vegetarianismo no Ocidente. Logo alguém achou na Bíblia uma justificativa para se viver de alface: o homem não era originalmente carnívoro, diziam, só depois do Dilúvio é que fomos comer carne. É claro que havia gente menos sensível, que não se incomodava em comer uma boa bisteca. Mas mesmo esses tiveram que mudar sua atitude à mesa, para não ofender a sensibilidade alheia. Nada de servir leitões, lebres ou vacas acompanhados de suas cabeças, como era comum até o século 18. Entre o descaso de uns e o zelo excessivo de outros, foram surgindo leis para regular o trato dos animais. Em linhas gerais, até hoje elas permitem o uso de algumas espécies e a eliminação das ameçadoras. Mas causar sofrimento por prazer é proibido.



Temos direito de úsa-las, TEMOS DIREITO DE ÚSÁ-LOS?
Como todas as outras espécies, a humanidade tem o direito de fazer o que achar necessário para sobreviver e se multiplicar. Qualquer coisa, desde dizimar os búfalos norte-americanos até virar vegetariano. Os únicos limites a isso são aqueles impostos por nós mesmos, que começam como regras morais e acabam virando leis. Portanto, se alguém conseguiu convencer o resto da humanidade (ou a parte mais influente dela) de que não é legal maltratar animais, nada mais justo que se proíba os maus tratos. Agora, entidades como a Peta (People For the Ethical Treatment of Animals, ou Pessoas pelo Tratamento Ético de Animais, em português) querem nos persuadir a deixar de usar os animais para tudo. E, para nos convencer dessa idéia, estão jogando pesado (como comparar matadouros com campos de extermínio nazistas).

A proposta de abandonarmos de vez os animais não é nova. Ela já está por aí, tentando conquistar adeptos, desde 1975, quando foi publicado Animal Liberation ("Libertação dos Animais", inédito no Brasil), escrito pelo filósofo australiano Peter Singer. Na época, o livro foi saudado como uma sequência lógica dos fatos recentes. A escravidão dos negros foi banida no século 19, mas sua igualdade só foi reconhecida na metade do século 20 (muita gente dirá que ainda não foi). A fumaça dos sutiãs queimados, marca do movimento feminista, ainda estava no ar. E os homossexuais começavam a ser admitidos como iguais. Parecia que, na infinita fila dos oprimidos, era chegada a vez dos animais.

E Singer mostrou-se um bom advogado dos não-humanos, com boas respostas para tudo. Sua teoria se baseia na idéia da igualdade entre os homens. Certo, somos todos iguais perante a lei. Mas igualdade, diz ele, não quer dizer que somos idênticos. Algumas pessoas são mais inteligentes que outras. Para o conceito de igualdade, isso não importa. Se o físico alemão Albert Einstein precisasse de um transplante de rim, não poderia obrigar ninguém, nem o pior aluno da escola local, a doar seu órgão a ele. Por que? Porque o interesse dos dois tem o mesmo valor. Para Singer, não há razão para que isso não valha também para os animais. "Se a posse de um grau mais alto de inteligência não autoriza um ser humano a usar outros seres humanos para seus próprios objetivos, como poderá autorizar os humanos a explorar, com o mesmo propósito, os não-humanos?"

Mas isso não significa conferir aos animais os direitos ou o tratamento dados a uma pessoa. Conceder direito de voto aos cavalos não faria sentido nenhum. Só os interesses iguais podem ser comparados. E onde é que nossos interesses se igualam aos de um boi? Na aversão ao sofrimento, diz Singer. Animais, assim como humanos, sentem dor e não gostam dela. Ou seja, devemos evitar causar dor a eles com o mesmo cuidado que evitamos causar dor a uma pessoa. E isso vale para vários tipos de sofrimento, inclusive psicológico: medo, ansiedade, frustração e estresse. É nossa obrigação evitar causar esses sentimentos a eles, com tudo o que isso significa: parar de comer carne, abandonar experimentos científicos com cobaias e banir os animais de estimação, para ficar nos três exemplos mais dramáticos.

Não é uma mudança das mais fáceis, mas, mesmo assim, é difícil escapar do raciocínio de Singer. Afinal, por que temos consideração pelo sofrimento de outro ser humano e não pelo dos não-humano? Se você pensou em responder "porque somos humanos", cuidado. Reservar privilégios ao grupo a que você pertence é preconceito, diz Singer, como racismo e sexismo. Discriminar animais só porque são animais é chamado de especicismo, uma atitude moralmente indefensável, diz ele.

Mas humanos têm uma noção de futuro que os animais não alcançam. A morte de uma pessoa, portanto, tem mais significado que a de um animal, porque com ela morre um plano para os dias que virão. "Uma pessoa com uma deficiência mental grave e órfã não tem essa noção de futuro", diz Peter Singer. "Um chimpanzé ou um porco tem um grau mais alto de autoconsciência e uma maior capacidade de relacionar-se do que uma criança com uma doença mental séria." Os animais, portanto, merecem um direito à vida tão consistente quanto o assegurado aos doentes mentais. É claro que ele não está sugerindo que ocupemos o manicômio e cortemos os internos em bifes. Sua intenção não é degradar doentes mentais, senis ou crianças, mas justamente o contrário: elevar o status dos animais.

Então, professor Peter Singer, como deveríamos tratar os animais? "No que diz respeito aos animais selvagens, deveríamos abandonar o contato com eles. Quanto aos outros, deveríamos parar de reproduzi-los, exceto por um pequeno número deles, que poderíamos manter em reservas para que não fossem extintos", disse ele em entrevista à Super.

É bom que se diga que Singer é um filósofo utilitarista, ou seja, para dizer se uma atitude é certa ou errada, ele estima seus efeitos e decide baseado na comparação entre o prazer e o sofrimento que ela causaria a todos os afetados. O detalhe é que ele põe no cálculo também os sentimentos dos bichos (vertebrados somente, porque, até onde sabemos, são os únicos que sentem dor). Mas há ressalvas. Se nosso interesse entrar em conflito com o dos animais, temos prevalência, porque nossa capacidade de planejar o futuro eleva nossa existência. Também está liberada a autodefesa contra ameaças animais. Ou seja, se você acabar em uma ilha deserta com uma vaca, fique à vontade para devorá-la. E, se sua casa for infestada por ratos, tudo bem eliminá-los.

No mundo de hoje, se calcularmos o sofrimento usando a fórmula de Singer, vamos descobrir uma dívida moral imensa. A fazenda está longe de ser um lugar bucólico cheia de bichos felizes (leia quadro na página xx). Ponha-se no lugar de um frango que vive amontoado sob luz artificial quase ininterrupta, equilibrando-se no arame do fundo da gaiola e que tem seu bico cortado com uma lâmina quente, para evitar que ele selecione a comida que lhe é dada (e para que, de nervoso, não ataque e mate os outros frangos), até que, um dia, uma descarga elétrica o ponha para dormir enquanto uma lâmina corta seu pescoço. Sua vida está mais próxima de um pesadelo sem fim do que de um sonho idílico. Multiplique essa tortura por 14,85 bilhões de aves que vivem nas condições acima e você verá o tamanho da nossa culpa.

Onde foi parar aquele respeito ancestral, que exigia desculpas por cada animal abatido? Segundo o jornalista americano Michael Pollan, em seu artigo na revista do jornal The New York Times, a consideração foi soterrada pelo dinheiro. "Sempre houve uma tensão entre a pressão capitalista para maximizar os lucros e as regras religiosas da comunidade, que serviam como um contrapeso para a cegueira moral do mercado", diz ele. "As criações industriais são um exemplo do que pode ocorrer na ausência de constrangimento moral." Mateus Paranhos da Costa, etólogo da Unesp em Jaboticabal, especialista em bem-estar animal, diz que o problema é medir nosso convívio com os bichos pela relação custo-benefício.

E aí, você se convenceu de que devemos abandonar o uso de animais? Antes de responder, talvez seja melhor saber se isso é possível.



Podemos viver sem eles?
Não. Primeiro, por questões alimentares. É verdade que o consumo de carne, que ao longo da evolução humana desempenhou um papel fundamental no desenvolvimento de nosso cérebro potente, já não é mais fundamental. Apesar de sermos onívoros por natureza (digerimos carne e vegetgais), conhecemos hoje fontes protéicas capazes de substituir o bife. Mas submeter crianças a uma dieta vegetariana, como sugere Singer, seria no mínimo leviano. Para obter proteína suficiente da dieta vegetariana, precisamos ingerir grandes porções de vegetais protéicos, como soja e feijão. E muitos nutricionistas acham que algumas crianças não conseguiriam processar a quantidade de soja necessária para um crescimento saudável. Enquanto restar essa dúvida, é legítimo que os pais tenham a opção de oferecer um filé aos seus filhos.

Além do que, uma humanidade vegetariana causaria um impacto ambiental razoável, porque consumiria muito mais petróleo. Primeiro porque o vai-vém de alimentos pelo planeta aumentaria. Vivemos em todos os cantos do globo há tanto tempo porque comemos carne, mas são poucos os locais do planeta capazes de produzir uma dieta completa de vegetais. Para driblar essa deficiência, seria preciso transportar muita comida ou investir pesado em fertilizantes (se bem que o melhor adubo, o esterco de boi, estaria escasso). Além disso, a principal alternativa ao couro são os tecidos sintéticos, feitos de derivados de petróleo (sem contar os produtos industriais que levam algum composto animal. Leia alguns exemplos na página XX).

Mantenhamos os bois e libertemos os demais, então? Ainda não. Se a controvérsia quanto à carne persiste, a briga esquenta mesmo quando se fala de pesquisa científica com cobaias, chamada de vivissecção. De um lado, os cientistas defendem que estudar doenças e tratamentos em seres vivos é fundamental para os avanços médicos e farmacêuticos. A cura do câncer, a vacina contra a Aids e a luta contra o Alzheimer e o mal de Parkinson, por exemplo, dependem da pesquisa de corpos inteiros, em funcionamento. Em posição oposta, os ativistas de proteção animal afirmam que pesquisas em animais não servem para nada, porque nossos corpos são muito diferentes. A falta de diálogo entre os grupos torna difícil saber se vale a pena brigar pelo fim dos experimentos.

Mas nossa dependência dos bichos vai além. Temos uma necessidade psicológica de nos relacionar com os animais que não pode ser satisfeita pelo contato humano. É o que diz Hannelore Fuchs, médica veterinária e psicóloga de São Paulo, especialista na relação entre humanos e animais. Hannelore leva cães e coelhos para visitar pacientes em hospitais e diz que há muitos benefícios nesses encontros. "O contato com os bichos faz o corpo liberar endorfinas (um analgésico natural), relaxa, melhora a resposta imunológica e comprovadamente diminui o tempo de hospitalização. Para pacientes deprimidos ou solitários, as visitas diminuem as queixas e o uso de tranquilizantes." Uma característica fundamental da relação com o animal, diz ela, é a disponibilidade. Um cão saudável atenderá feliz e prontamente o chamado do dono a qualquer hora do dia ou da noite. "Ninguém dá esse tipo de afeto", diz ela. O biólogo americano Edward O. Wilson chama essa afinidade de biofilia.

Para ele, há algo no nosso DNA que nos faz querer bem tudo o que é vivo.

Para o etólogo e antropólogo Antonio Fernandes Nascimento Júnior, o animal preenche uma lacuna existencial em nós. "O animal serve como um espelho, em que o ser humano procura ver a si mesmo. Os índios americanos comiam o bisão não só pela carne, mas também para adquirir sua força, seu espírito", diz ele. E isso continua valendo. "O dono do pitbull enxerga no cão características que ele admira, que valoriza para si. E o caçador, em geral, tem uma reverência por sua caça."

Enfim, viver sem animais seria um sonho pouco realista. Para o etólogo Cesar Ades, da Universidade de São Paulo, especialista em comportamento animal, o homem nasceu entre os animais e sempre teve relações com eles. "Não usar animal nenhum faz parte das utopias", diz Ades.



Então, como tratá-los?
Se você acredita nas idéias de Peter Singer e acha que só devemos utilizar os animais no que for indispensável, há uma expressão utilizada pelos ativistas que pode ajudar: "redução, refinamento e substituição". Isso significa reduzir o consumo de animais onde eles são indispensáveis (carne só para as crianças, por exemplo), melhorar o tratamento aos bichos que forem utilizados (ainda há frangos criados soltos) e substitui-los onde for possível (algumas marcas de cosméticos não testam produtos em cobaias). Essa é a atitude mais radical. A partir daí, até os limites aos maus tratos impostos pela lei, há vários caminhos, que só cabe a você escolher.

Mas é impossível tratar melhor os animais se não soubermos como eles querem ser tratados. É preciso conhecer suas vontades. E cada vez há mais informação sobre suas necessidades.

Em primeiro lugar, é preciso entender que a domesticação não precisa ser uma exploração. Do ponto de vista ecológico, a domesticação é uma simbiose, uma associação entre espécies em que ambas se beneficiam, ou seja, elas se tornam mais aptas a se multiplicar e sobreviver, mesmo que nas condições mais hostis. Por esse ponto de vista, os animais de estimação podem ser considerados um caso de sucesso. É bom lembrar que os bichos domésticos proliferaram, enquanto os selvagens foram dizimados. Nos Estados Unidos, por exemplo, há 10 mil lobos, contra 65 milhões de cães. Além disso, se a domesticação fosse algo imposto aos bichos, como explicar os muitos casos de animais que se entregam voluntariamente ao convívio humano? O pato crioulo, por exemplo, uma ave selvagem brasileira, pousa às vezes em uma granja, atraído pelo alimento e pela tranquilidade. Vai ficando, ficando até que, de tão pesado, não consegue mais voar e fica na fazenda. Acaba na panela.

Pode-se dizer que o animal de criação não tem liberdade para fazer o que quer. Mas, afinal de contas, quem tem?

A teoria de Singer (e a motivação dos ativistas) soa tão diferente porque ele não acredita nisso. Ele discorda de uma premissa básica da teoria mais difundida sobre a natureza. Em outras palavras, ele não acha que as espécies tenham como interesse fundamental a sobrevivência. "Eu não acho que a reprodução é um interesse básico para os animais", disse ele à Super.

E se criássemos animais com respeito por suas necessidades e os matássemos sem dor? Nesse caso, nem Peter Singer iria se opor: "Eu não estaria suficientemente confiante nos meus argumentos para condenar alguém que comprasse carne de um lugar desses", disse o filósofo em entrevista à revista do The New York Times. De fato, viver confortavelmente e no final ser morto de um golpe, sem desconfiar do perigo, parece bem melhor do que viver sob perigo constante em liberdade e, um dia, acabar perseguido por um um grupo de lobos recebendo mordidas nas canelas ou ser devorado vivo por um urso. Guardadas as diferenças, é uma troca parecida com a do sujeito que abre mão do impulso genético de transar com o maior número de garotas para viver no conforto do casamento.

Em outras palavras, não é preciso abandonar os animais para evitar causar sofrimento a eles. Basta tratá-los da melhor maneira possível. Mas como saber o que eles querem, se eles não falam? O movimento de proteção animal desenvolveu uma lista de mandamentos que, se cumpridos, eliminam o sofrimento animal. Chama-se As Cinco Liberdades Básicas e diz que devemos livrar os animais de: 1) fome e sede, 2) desconforto, 3) dor, machucados ou doenças, 4) limites ao seu comportamento normal e 5) medo e estresse. Para o etólogo Mateus Paranhos da Costa, da Unesp, em Jaboticabal, a cartilha é uma fantasia de quem não lida com animais. "A busca pela ausência de sofrimento é justa, mas não é realista. O sofrimento faz parte da vida." O fundamental, diz ele, é o respeito pelo bicho. E, para isso, é preciso despertar o respeito nas pessoas que lidam com animais e informá-las sobre as necessidades dos bichos.

Até os animais de estimação precisam de mais respeito. Segundo o veterinário canadense Charles Danten, bichos de companhia sofrem, e sofrem muito. Tudo começa na infância do animal. O filhote se liga em quem cuida dele, seja a mãe ou o dono. Na natureza, a mãe corta essa ligação para que o filhote aprenda a cuidar de sua vida, mas, fora dela, o dono a incentiva, impedindo o mascote de alcançar a maturidade emocional. Como um filho mimado, o animal vive carente de atenção e adota comportamentos bizarros para conquistá-la, como se masturbar, derrubar coisas ou morder as visitas.

Quando isso acontece, a maioria dos donos abandona, passa a tratar mal ou dá ainda mais cuidados ao animal, o que só piora a situação. Alguns levam o bichinho a um psicólogos de animais, mas, quando descobrem que eles também precisam mudar seus hábitos, acabam aceitando a sugestão de dar remédios como Prozac ou Valium para o mascote ficar mais tranquilo. A atitude mais saudável seria deixar o animal à vontade para se expressar como queira, mesmo que isso signifique não dar a mínima para o dono. Mas, diz Danten, como há pouco sentido em ter um animal que não pode ser moldado à nossa maneira, o melhor é não ter animais, coisa que ele promete fazer assim que seu gato morrer.

Mas aos poucos o respeito está voltando. Em algumas granjas, as galinhas ganharam puleiros, ninhos e brinquedos para passar o tempo. Na fazenda, os vaqueiros que são alertados para ter mais cuidado com o animal facilmente percebem os abusos que cometem e melhoram o trato. Nos laboratórios, a anestesia é cada vez mais usada nos testes com cobaias. No zoológico, tratadores escondem a comida pela jaula, para o animal passar mais tempo procurando por ela, como na natureza. Quem sabe, em algumas décadas, estaremos novamente rezando para o bife que nos é servido.



Animais de estimação
Há cerca de 800 milhões de gatos e cães no mundo. Nos Estados Unidos, uma em cada três casas têm um bicho de estimação.

Experiências científicas
Para estudar doenças e testar remédios e produtos químicos, usa-se cobaias. Mais de 30 milhões morrem por ano no mundo nesse tipo de testes.

Carne, carne, carne
No mundo, há 15 bilhões de frangos e galinhas, 1,5 bilhão de patos, gansos e perus, 1,5 bilhão de cabeças de gado e outros 1,75 bilhão de bodes e ovelhas. A maioria destina-se ao abate

A vaca está em tudo
Produz-se muita coisa com o corpo da vaca. Com o sangue faz-se cola, espuma para extintores de incêndio e vacinas. O sebo vira sabão, tinta e até explosivos. Os tendões das patas rendem cosméticos e medicamentos. Os ossos são usados para fazer filmes fotográficos e de raios X.

Os intestinos viram fios de sutura. E o esterco é o melhor fertilizante.

O porco também
A constituição física do porco é muito parecida com a nossa. Por isso, eles servem como doadores de órgãos. Usamos sua pele e seu coração, entre outros

Morte lenta e violenta
A vitela é a carne de um bezerro anêmico que passa seus cinco meses de vida em um cercado minúsculo, impedido de se mover, para a carne ficar macia.

Pesadelo sem fim
Galinhas poedeiras vivem espremidas ob luz quase ininterupta para que comam e botem ovos sem parar. Seus bicos são cortados para evitar canibalismo.

Nascidos para morrer
Para obter ratos sem contaminação, os cientistas retiram o útero de uma rata em final de gestação e extraem as cobaias.

Mortos pela embalagem
Bichos com pele valiosa não dão cria em cativeiro e são caqçados. Passam dias com a pata dilacerada, presa em armadilhas

Envenenamento lento
Para testar a toxicidade de um produtos de limpeza, cométicos e medicamentos, 6 a 9 animais são forçados a ingerir doses crescentes da substância, por até 15 dias, até que metade morra. Os sobreviventes são mortos para estudo

Ácido no olho
Alguns produtos também são testados em tecidos sensíveis. Nesse caso, pinga-se a substância nos olhos de coelhos. Em alguns casos, a córnea vira uma pasta.

Foie gras
Três vezes por dia, durante 20 dias, um tubo é enfiado no pescoço do ganso e por ali bombeia-se um quilo de milho e banha. Depois, um anel evita que ele regurgite. Seu fígado adoece. É com ele que se faz o patê de foie gras.

Meu garoto!
Os bichos perdem parte do encanto quando deixam de ser filhotes. Mas incentivar o comportamento infantil é prejudicial ao animal adulto. Causa dependência emocional e deixa o bicho carente de atenção e ansioso, como um filho mimado. Se o seu animal não desgruda de você, pode ser sinal de que você não é um bom dono.

De orelha em pé
No passado, cortavam-se o rabo ou as orelhas do cachorro para torná-lo mais ágil em caçadas. Hoje, esse tipo de cirurgia é uma mutilação que já foi banida em muitos países.

Beleza demais
A tosa é uma necessidade, não uma chance para embelezar o bicho. Fazer esculturas de pêlo confunde a noção que ele tem do corpo. Tente andar de cartola um mês, para ver como é.

Venda no nariz
Cheirar é um grande prazer para o animal. Cães e gatos têm o olfato muito mais apurado que o nosso e descobrem o mundo pelo nariz. Colocar perfume no bicho, mesmo que muito sutil, é como colocar uma venda nos olhos de uma criança.



NA LIVRARIA:
O Homem e o Mundo Natural, Keith Thomas, Companhia das Letras, 1988 A Vida dos Animais, J.M. Coetzee, Companhia das Letras, 2002
Vida Ética Peter Singer, Ediouro, 2002
Animal Liberation, Peter Singer, Avon Books, 1991
The Animal Rights Debate, Carl Cohen e Tom Regan, Rowan & Littlefield Publishers, 2001, EUA
Drawing The Line, Steven M. Wise, Perseus Books, 2002, EUA

NA INTERNET:
www.angryvet.org
www.arcabrasil.org.br


Fonte: Revista Super Interessante

domingo, 13 de junho de 2010

Oração para a Energia da Abundancia da Sexta Dimensão - (Michelle Eloff; Site Anjo de Luz)

"Querido Deus Pai/Mãe, e Mestre Jesus, peço que facilitem o processo de alinhamento de todo o meu campo eletromagnético, todo o meu sistema de chacras e em todos os níveis e em todas as dimensões, paralelas e alternadas, com a energia da abundância dentro da sexta dimensão que atualmente está sendo criada.

Peço aos poderosos criadores da vida que existe, que me tragam a todos os meus corpos sutis,incluindo meu corpo físico, meu corpo emocional, meu corpo mental desta vida e de qualquer outra vida, a um alinhamento perfeito e harmonioso com esta energia da abundância sustentada dentro da sexta dimensão.

Peço que todas as energias da natureza da consciência, do subconsciente e inconsciente conectadas à limitação, ao temor, à carência e ao sofrimento do meu ser atual e a todos os seres paralelos e alternados, sejam desconectados, desmantelados e separados imediatamente harmoniosamente e de maneira perfeita e milagrosa.

Ordeno que o fluxo puro e divino do amor, jubilo, paz, harmonia, auto estima, auto amor, auto aceitação, êxito em toda a sua forma absoluta, abundante e qualquer outro aspecto de abundância que a minha alma acredita que é parte do meu ser, que venha a manifestação imediata de acordo com a mais elevada vontade de minha alma em estado de graça, de maneira perfeita, harmoniosa e milagrosa.

Eu aceito, conscientemente, que me liberte de todos os pensamentos de temor, atitudes de temor, condicionamentos, percepções e atitudes do estado de consciência de vítima.

Eu aceito, conscientemente, libertar de todos os níveis - consciente, subconsciente e inconsciente, nesta vida e em todas as vidas paralelas e alternativas, programação genética, do estado da consciência da pobreza, estado de consciência de vítima, estado da consciência do amor egocentrico que tem feito gerado experiências limitativas nesta vida e em qualquer outra vida que tenha vivido.

Eu aceito, conscientemente, viver em harmonia e aceito o alinhamento com padrão divino que o Deus Pai/Mãe criou para mim mesmo, no princípio da minha existência e ordeno que este padrão do amor divino, da Luz Divina, da Sabedoria Divina, do Poder Divino, do Conhecimento Divino e da Verdade Divina se faça UNO comigo AGORA e recebo a graça de maneira perfeita, harmoniosa e milagrosa.

Renuncio a todo o TEMOR.

Querido Deus Pai/Mãe entrego meus medos transformando-os do meu plano e vontade Divina"

Com muito Amor."



Michelle Eloff
Site Anjo de Luz
Postado por Evandro Amaral em 6 junho 2010

sábado, 12 de junho de 2010

Como viver Espontaneamente na Matrix? - (Sri Prem Baba)


Pergunta: Como viver espontaneamente presente no agora se há uma lei de causa e efeito? Ou seja, se minhas ações presentes determinam efeitos futuros, como viver a minha verdade se ela pode causar sofrimento no futuro? Como não temer?

Prem Baba: Claro, não há como viver espontaneamente estando completamente identificado com a mente. A espontaneidade não é um produto da mente. Temos que diferenciar espontaneidade de instintividade, ou ainda, a ação da reação. Você está sonhando com a liberdade. Você está imaginando a espontaneidade, mas você ainda não sabe o que é isso porque age a partir do medo. Você tem medo do resultado das suas atitudes. Por isso a necessidade de controlar cada passo. A sua vida é uma operação matemática. Você tem que saber exatamente o que cada ação vai proporcionar porque você precisa ter um futuro seguro. Então, você precisa fazer tudo absolutamente certo. Essa segurança que você busca não existe; esse controle está imobilizando os seus passos e está secando a sua criatividade; está estagnando todas as possibilidades de inovação e criações na sua vida.

Viver com a necessidade de que tudo dê absolutamente certo, seca a alegria de viver. A reação nasce do medo, a instintividade é um sistema de auto-proteção; é um mecanismo de sobrevivência. A espontaneidade é um fenômeno da alma. A ação nasce do coração e é sempre cheia de sabedoria e compaixão. Se ela nasce da presença é o mesmo que dizer que nasce da verdade porque a presença é a verdade e a verdade é Deus. Então, a ação correta é aquela realizada por Deus.

O que pode estar errado? O que é que você entende como errado? O errado são as reações que surgem a partir do medo. Você identificado com o corpo, precisando usar o instinto para se proteger. Tudo que é criado a partir do medo nós podemos chamar de construção erronia. O medo surge da sua identificação com o falso eu, com a imagem idealizada criada para agradar, para receber energia do outro. O erro é aquilo construído a partir da máscara e tudo aquilo que é construído a partir da máscara, em algum momento vai cair. Ontem mesmo eu recebi um email de um buscador espiritual que está na sua cidade e está querendo se suicidar porque ele foi vendo tudo o que ele acreditava ter realizado desaparecer da frente dele. Ele perdeu a mulher, os filhos se afastaram, perdeu o emprego, a fé, a esperança... Ele escreveu dizendo que ele ainda tinha um pouquinho de fé em mim e por isso estava me escrevendo. Esse momento chega para todos. Em algum momento na jornada evolutiva, as construções baseadas no medo e no erro devem desmoronar o que pode ser extremamente doloroso principalmente quando a pessoa acredita que o desmoronamento é devido a um erro pessoal. O subtexto é assim: “Eu estou dando o meu melhor, estou dando tudo que posso e tudo está sendo tirado das minhas mãos, tudo está desaparecendo”. A pessoa acredita que tudo está desaparecendo e que ela mesma causou isso. Eu não diria que é um erro pessoal, eu digo que é um aspecto da evolução da consciência humana. Durante o processo evolutivo, quando você está identificado com a máscara, com o erro, ou melhor, com a mente, você age a partir do medo. Essa construção, em algum momento, vai cair. Se você for honesto, irá perceber que isso que está indo embora não lhe dava satisfação, mas lhe dava uma idéia de segurança. “Isso eu controlo”. Pode estar um horror, uma tremenda escuridão, mas é a “minha escuridão”, é o “meu horror”, “eu controlo”.

Você tem medo de experienciar essa construção desabar, mas se você estiver compreendendo o que estou dizendo, você vai querer que a mentira desabe e vai querer que as construções baseadas no medo caiam. O que não quer dizer que não seja doloroso, mas se você já viu que não se trata de uma recaída, muito pelo contrário é a sua evolução que está permitindo esse desmoronamento, você dirá “seja bem-vindo”. Porque, para o novo surgir, o velho tem que desaparecer. Eu sei que o seu sofrimento é porque o velho está indo embora e o novo ainda não surgiu. Isso é porque você está sendo ensinado a confiar. Você está aprendendo a confiar na sabedoria da incerteza, a confiar na guiança do grande mistério. É somente daí que surge a verdadeira autoconfiança que é a real segurança. Se a segurança está baseada em alguma coisa que está fora é claro que ela não é a autêntica confiança. Em algum momento você vai ter que reconhecer essa segurança dentro de você, mesmo na relação com o mestre espiritual. Hoje eu sei que lhe dou segurança, mas em algum momento eu vou ter que dar um chute na sua bunda e deixá-lo caminhar sozinho. Senão você vai passar a vida inteira dependendo de algo que está fora e achando que encontrou a segurança. Esse segurança é ilusória.

Se você realmente vive espontaneamente, de forma natural e desprendida, suas ações estão cheias de sabedoria e compaixão. Você está trilhando o caminho do coração, o caminho da verdade. Você está criando um futuro iluminado, mas isso é outro assunto porque você não se preocupa com o futuro. Você pode visualizar o futuro até para se mover no plano horizontal. Eu sei que vou acabar o satsang e vou sair por esta porta para realizar alguns compromissos. Você sabe que um dia vai ter que voltar para casa. O poder de fazer planos para se mover também é sábio desde que você não se apegue a um desfecho determinado senão você se aprisiona no seu plano. Você não pode controlar o fluxo da vida. Deus tem seus mistérios e é exatamente ai que está a chance de você experienciar a alegria de viver. Porque uma vida completamente determinada e previsível acaba com o entusiasmo de qualquer um. Ontem nós estávamos falando sobre sexualidade. O que faz Eros ir para outra direção? Justamente a previsibilidade. “Eu estou cansado de comer a mesma comida, eu quero ir ao restaurante. Eu quero variar um pouco”. Você cansou do sabor dessa comida. Por quê? Porque você se acostumou a fazer sempre a mesma coisa, porque precisa de segurança. Você determina como as coisas devem ser para que tudo aconteça corretamente, mas na verdade você está trancando o mistério dentro do cofre. Ai acaba o senso de aventura. Viver espontaneamente é viver o momento, guiado pelo grande mistério, é possível que você seja convidado a ir para uma outra direção. Se você estiver realmente presente, você vai saber se é uma distração ou se é o fluxo da vida te levando.

“Como viver a minha verdade se isso pode causar sofrimento no futuro?” O problema é a sua verdade. A verdade não vai causar problema nenhum, mas a sua verdade pode causar muitos problemas. Você tem razão. Porque a sua verdade tem base em crenças. Compreende o que estou dizendo? Existe a minha verdade, a sua verdade e a verdade. A minha e a sua com certeza lhe trarão problemas. Mas, a verdade jamais lhe trará problemas. A verdade pessoal, ou seja, a verdade do ego tem base nesse medo construído a partir de informações vindas de fora; crenças, preconceitos, conceitos e conhecimento que determinam para você o que está correto. O que eu quero dizer é que você está obstinado a fazer o que é certo. Quem está querendo fazer certo é o eu idealizado, ou seja, é uma construção mental que tem como meta a perfeição. Tem que ser perfeito para poder agradar, para poder ser amado. Então, a espontaneidade autêntica talvez não se encaixe com esses códigos que você carrega. Talvez você desagrade um ou outro. Mas, você quer ser feliz ou quer agradar ao outro. Nesse momento, as duas coisas, eu sei, mas você vai ter que escolher. Esse é o significado da frase que diz que não é possível servir a dois senhores. Você não pode servir a máscara e o seu eu real.

É interessante que se você começa a agir corretamente (neste caso quando falo corretamente, quero dizer a ação correta, aquela que é baseada na intuição e na confiança), essa ação te levará à desconstrução do erro que acabei de falar. Ai pode ressuscitar o medo que já estava morrendo. É nessa hora que você precisa parar, respirar fundo e se recolher no silêncio, ampliando ao máximo a sua percepção, a sua observação, para compreender o que está acontecendo. Você está passando por uma transição; você está experienciando uma mudança. Antes você estava sendo levado pelo medo e agora está começando a se deixar ser levado pela confiança. Você fica lá e cá até que possa se render à confiança, à voz do silêncio que é a intuição, a voz do mestre. Se render ao amor.

Deus tem um plano para você e você já sabia desse plano ao encarnar, mas você se esqueceu e agora está sendo lembrado. É como se estivesse sendo despertado de um encantamento. Você estava encantado com a história do eu idealizado, a história da máscara, da auto-imagem. É um encantamento. Quem é você? Eu sou fulano de tal, eu vivi isso e aquilo... Você conta todo o seu currículo. Esse não é você. Você não é a sua história. Você acredita ser a sua história, o seu nome, mas isso é um encantamento. E você tem medo que o seu cérebro seja lavado. Todo o cristão tem medo de deixar de ser cristão, o judeu tem medo de ser judeu, o hindu tem medo de deixar de ser hindu e assim por diante. Assim como você tem medo de perder o que acredita ser sua identidade. Você tem medo de perder as referências, por isso tem que controlar tudo. “Eu vou nessa direção desde que as coisas aconteçam desse jeito”. Se você age a partir do medo, eu preciso lhe dizer que está condenado a viver uma vida muito sem graça. Isso é matemática. (risos)

Então, meu amado amigo, chegou a hora de você resgatar a aventura de viver, de resgatar o entusiasmo de viver uma vida misteriosa. Para onde você vai? Para onde a vida te levar. Livre assim como a brisa. “Ai que medo!”. Para onde a brisa vai?


Abençoado seja cada um de vocês. Receba a benção que te ajuda a seguir o que o coração determina. Até o nosso próximo encontro.

NAMASTE

terça-feira, 8 de junho de 2010

Vibrações de Alegria Cancelam Crenças Indesejadas - (Abraham, canalizado por Esther e Jerry Hicks)


Convidado: Você fala que quando você está se sentindo bem ou mal, e tem fortes sentimentos sobre isto, então é muito claro perceber o que se está atraindo, mas uma grande parte do tempo, você está no meio-termo, e não sabe o que está atraindo. Em outras palavras, uma pessoa estava atraindo vulnerabilidade, ela tinha uma vibração de um certo grau de vulnerabilidade e não percebia isto.

ABRAHAM: Sim, mas depois o que aconteceu? Fosse qual fosse a sua vibração, ela atraiu uma condição que, em seguida, ajudou-a a perceber o que era.

Convidado: Certo. Mas isso aconteceu após o fato.

ABRAHAM: Bem, estamos de acordo. Em outras palavras, o que você está dizendo é, seria melhor saber como estou vibrando antes de atrair algo que eu não quero.

Convidado: Certo. Mas o que estou entendendo é que você pode ter todas estas diferentes vibrações, você pode ter uma vibração para falta e uma vibração para vulnerabilidade ou todas essas coisas.

ABRAHAM: Existem apenas duas, na verdade: conectado ou não.

Convidado: Correto Quando se fala de alegria, ou da sensação de bem-estar, e se você está sentindo bem estar, isto pode eliminar todas estas outras vibrações?

ABRAHAM: Sim. Em outras palavras, você não pode estar conectado e desconectado ao mesmo tempo. Quando você está se sentindo bem, quando você esta aplaudindo, quando você esta reconhecendo aspectos positivos, então sua vibração não será de falta, ou carência.

Convidado : E você não precisa se preocupar com as crenças que você tem no seu subconsciente ou este tipo de coisas?

ABRAHAM: Bom, aqui está uma coisa, e isso é o que você está percebendo. Vamos falar um pouco mais sobre isso. Ao longo de sua experiência de vida, você lançou uma serie de pensamentos, e agora você está vivendo o culminar daqueles pensamentos que você lançou antes. Assim, em algumas áreas, você se sente mais seguro do que em outras. Pois bem, com muita freqüência, vocês não percebem, como acaba de nos dizer, o que você está realmente vibrando até que atraia a condição aumentada.Assim, o verdadeiro valor de sua experiência física é que uma vez que você tenha atraído uma condição,deixe que ela o ajude a identificar o que você realmente deseja, a ajude-o a encontrar um sentimento mais positivo que o ajude a atrair o que deseja, ao invés de simplesmente ficar “martelando” a condição negativa e ampliá-la..

Freqüentemente, o que vemos, é por exemplo, uma mulher que tem experiências negativas, porque talvez tenha tido um pai abusivo e, por isso, ela quer ser independente.e diz coisas como: "Eu não posso esperar para sair do âmbito desta dominação”.Porém apesar de falar em libertação, ela esta numa vibração de dominação. Portanto, a pessoa que ela atrai como seu primeiro parceiro tem essa mesma vibração como seu pai, e ele a controla e a domina, da mesma forma que seu pai fazia. Assim ela o tolera por algum tempo. Então ela atrai um companheiro, que é muito similar a sua experiência passada. Ela o tolera por algum tempo, mas com o tempo, diz: "Eu não posso agüentar mais, estou partindo." Mas esta sua ação, ainda esta baseada na vibração de falta - o que significa que o seu ponto de atração não mudou. Então, ao longo deste processo, se não houver um reconhecimento do porque a mesma coisa continua vindo, sempre o mesmo continuará a vir. É a afirmação do "não estou querendo isto", que provoca uma erupção de clareza do que eu "realmente estou querendo , mas depois vem a parte mais difícil, que é como vocês dizem:”Como eu posso me sentir seguro quando estou sendo assaltado ou como posso me sentir livre quando estou na prisão ", e nós dizemos, é aí que está o seu trabalho. Você precisa descobrir através de tentativa e erro que o que você conjura e vibra é o que você atrai.. Então, o que nós o incentivamos a fazer é pensar e sentir, pensar e sentir, pensar e sentir e perceber os resultados.

Pensar e sentir, pensar e sentir, pensar e sentir e perceber os resultados, até que sem grande esforço, você possa convencer-se de que o que vem para você é absolutamente correlacionado à forma como você tem sentido sobre esse assunto. E uma vez que você compreenda o que ocorre em um aspecto de sua vida, então você será capaz de aplicar em outro e outro e outro. Veja, nós sentimos o desconforto físico dos nossos amigos quando nós ensinamos isso: Ouvimos vocês dizerem: "Você quer dizer que eu tenho crenças subconscientes que estão, na realidade atraindo para mim coisas que não quero ? "Isso soa um tanto desconfortável, não é? "Você quer dizer, eu poderia ter pensado algo que não quero e atrair algo que eu não quero", e nós dizemos,calma, porque cada vez que você está fazendo isso de forma suficientemente significativa e que poderia afetá-lo, você saberá.. Seu Sistema de Orientação sempre lhe diz. Você tem uma emoção negativa sobre aquilo. Seu Sistema de Orientação está sempre lhe dando um sinal de advertência. Cada vez que você estiver, através de sua vibração, permitindo algo que você não queira, você sentirá uma emoção negativa. Assim, quando você sentir emoção negativa, você diz: "Ah, isso é bom. Meu Sistema de Orientação está funcionando. Eu posso sentir que estou agora vibrando em harmonia com algo que não quero. Então o que eu realmente quero e por quê? "

Muito freqüentemente, o departamento de estradas, coloca obstáculos reflexivos sobre as linhas da estrada,que são úteis quando se dirige a noite.. Bem, quando Esther dirige à noite, às vezes ela sem querer, dirige sobre eles. Seu marido diz que ela dirige por Braille, e quando ela sente os solavancos por sob seu pneu, ela sabe que esta saindo fora. E ela também sabe que se não fizer alguma coisa,e recolocar-se na direção correta, tomar uma nova decisão, ela pode acabar na vala ou bater em outro carro. Então, os solavancos são como suas emoções negativas. Eles permitem que você saiba que, embora sem querer, você está no caminho para a vala. Portanto, basta parar e dizer, "Ahh, isso é bom. Sei o que não quero. Não quero cair na vala. O que é que eu quero?” E ao reafirmar o que você quer e se recolocar no sentimento adequado, você muda seu ponto de atração.

Agora, eis o que vocês estão fazendo. Por alguma razão, você está vibrando e pode não saber o que é isso e continua apenas vibrando, até que você atrai uma experiência ou uma condição que você não gosta muito, e então você diz, "Humm, eu não quero isso”.Agora, o que a maioria dos seres físicos faz, quando têm uma experiência que não querem, é ficar repetindo porque não querem aquilo, então rezam para Deus: “Dê-me uma coisa diferente”.Eles procuram seu chefe, "Dê-me uma coisa diferente”.Eles procuram seus companheiros ou o governo :” .Dê-me algo diferente.” Mas todo o tempo que eles estão pedindo uma coisa diferente, eles estão condenando-se, por sua vibração, a permanecer com a mesma coisa que não querem. Isto é o que chamamos usar o contraste do Universo de forma desvantajosa. A maneira de usá-lo para a sua vantagem é identificar claramente o que não é desejado, o que sempre ajuda você a clarificar o que é desejado.E então, como você se conectou no que você realmente quer, você pode descrever o que você realmente quer e porque você quer. Você imagina aquilo, você tem uma visão daquilo, você descreve aquilo até que você possa sentir aquilo. Agora, você sente aquela vibração, que pode ter existido anos dentro de você, e utilizando o contraste do Universo - você tem sua vibração em um novo ponto de atração.E assim, a próxima condição que você irá atrair será menos grave que a anterior ou totalmente diferente.

Você já ouviu muitos professores dizerem: “Comece de onde você estiver", e o que eles estão dizendo é que você não pode mudar qualquer que seja o seu ponto de atração de uma vez só, porque foram muitos padrões de pensamentos para chegar até aqui, mas no momento que você está aqui, estas experiências são as confirmações do que você atraiu, de qual foi sua vibração. Portanto, se você não gosta do que está atraindo, tem agora a oportunidade para invocar uma imagem de algo diferente, ou melhor.

Se você fosse um escultor, moldando argila, não iria pegar um grande bloco de argila no primeiro dia jogá-lo em cima da mesa e depois se lamentar: “ Oh, não ficou bom”.Você iria moldá-lo, dia a dia, arrumando suas formas, praticando, e com bastante tempo, você poderia fazer com que aquele pedaço de argila tomasse a forma que você havia imaginado em sua mente Bem, você não está moldando argila, mas você está moldando Energia, e a maneira como você molda é pensando e sentindo, pensando e sentindo, pensando e sentindo.

Vemos alguns dos nossos amigos físicos, especialmente àqueles de vocês que foram alunos do curso de criação deliberada por algum tempo, e quando sentem alguma emoção negativa, começam a se autocriticar e dizer "Oh, eu não estou fazendo direito." Isso é o que incomoda vocês, é o que incomoda Jerry, quando tem gripe. Não por estar sentindo-se mal fisicamente, mas por ser irritante para ele por saber todas essas coisas intelectualmente e nem sempre estar em condições de aplicá-las. Mas quando você se bate e se critica, o que esta fazendo ? Sua vibração está se desconectando da clareza e da Energia que iria criar algo diferente. Portanto, em vez disso, em vez de ficar irritado consigo mesmo, quando você criou algo indesejado, ou tem uma emoção negativa, você deveria agradecer que seu Sistema de Orientação está trabalhando. Agradecer por estar consciente de como você está fluindo Energia e depois, gentilmente dizer : "Bem, se eu não quero isso, o que é que eu realmente queria, e por que gostaria que assim fosse?” E pouco a pouco e pouco a pouco, e pouco a pouco, e pouco a pouco e pouco a pouco, o seu ponto de atração será muito diferente. Em 30 dias, você poderá estar vibrando de uma forma muito diferente de como está hoje, e todas as pessoas que o conhecem saberão que algo mudou porque a corrente que flui em torno de você é muito diferente.

(Uma mensagem dos Abraham canalizado por Esther e Jerry Hicks )

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Poema que aconteceu - (Bruna Caram)


"Fui lá e disse:

- Vou fazer um poema pra você!

E ele:

- Vai nada!

E eu:

- Vou sim!

Mas eu não ia nada.

O impulso era a fé.



Até

Que ele sorriu da porta

- Eu sorri de volta -

E ele veio pro beijo.

(Meu Deus!, e que beijo!

Quente, perfumado…)

Depois, o lampejo

Da luz amarela

No sorriso branco

Escancarava, puro,

O escuro da barba

Criando, brilhante,

Amor grande e sem farpa.



O resto do corpo,

Só se aprochegava:

Crescia

Cobria

Coloria a gente!

Somente a beleza

Era nosso presente -

Tão forte e serena,

Que fez-me envolvida:

Nem vi, distraída,

Que ele era o poema…"



"* Confirmo e esclareço desde já que o título foi irresistivelmente furtado do poema de Carlos Drummond de Andrade, o Poema Que Aconteceu. Afinal, caiu como uma luva, além do quê, o poema do mestre trata de um domingo – data em que terminei este aqui. Que Drummond me perdoe o empréstimo póstumo – e a ele, todas as reverências."


Fonte: http://www.brunacaram.com.br/blog/?p=1303

Amor e Deus - (Nisargadatta Maharaj)


"O diálogo, ocorrido ao anoitecer, foi iniciado por um jovem canadense que vestia um Lungi e um fino Kurta (vestuário típico hindu). Disse que tinha vinte e três anos, mas parecia apenas ter saído de sua adolescência. Exibia, em torno do pescoço, uma elegante e pequena cruz de prata em uma delicada corrente. Ele disse que havia encontrado o livro Eu Sou Aquilo em uma livraria de Bombaim, dois dias atrás. Uma olhada rápida em poucas páginas motivou o desejo de encontrar pessoalmente Maharaj. Ele tinha lido o livro quase continuamente, do meio-dia até à noite, e terminou ambos os volumes apenas há poucas horas.

Maharaj: Você é tão jovem. Desejo saber desde que idade tem estado interessado na busca espiritual.

Visitante: Senhor, desde que me recordo tenho estado profundamente interessado no Amor e em Deus; e senti, com intensidade, que eles não são diferentes. Quando eu sento em meditação, freqüentemente...

M: Espere um momento. O que você entende exatamente por meditação?

V: Realmente, não sei. Tudo o que faço é sentar com as pernas cruzadas, fechar meus olhos, e permanecer absolutamente quieto. Sinto meu corpo relaxando, quase se desvanecendo, e minha mente ou ser, ou o que quer que seja, funde-se no espaço, e o processo de pensamento fica gradualmente suspenso.

M: Isto está bem. Por favor, prossiga.

V: Freqüentemente, durante a meditação, um devastador sentimento de amor extático surge em meu coração junto com uma efusão de bem-estar. Eu não sei o que é. Foi durante um de tais momentos de encanto que me senti inspirado a visitar a Índia – e aqui estou.

M: Quanto tempo ficará em Bombaim?

V: Realmente, não sei. Raramente, faço planos. Tenho dinheiro suficiente para viver frugalmente por quinze dias e tenho minha passagem de retorno.

M: Agora, diga-me, o que exatamente quer saber? Tem alguma pergunta específica?

V: Eu era um homem muito confuso quando desembarquei em Bombaim. Senti que iria perder o juízo. Realmente, não sei o que me levou à livraria, pois não leio muito. No momento em que apanhei o primeiro volume de Eu Sou Aquilo, experimentei o mesmo sentimento esmagador que obtinha durante minhas meditações. Conforme fui lendo o livro, um peso parecia estar sendo removido de dentro de mim e, agora que estou sentado aqui diante de você, sinto como se estivesse falando para mim mesmo. E o que estou dizendo para mim mesmo parece blasfêmia. Eu estava convencido que o amor é Deus. Mas agora penso que o amor é, seguramente, um conceito e, se o amor for um conceito, Deus também deve ser um.

M: E o que está errado nisto?

V: (Rindo) Bom, se você coloca isto desta maneira, não tenho nenhum sentimento de culpa em transformar Deus em um conceito.

M: De fato, você disse que Deus é amor. O que você quer dizer com a palavra ‘amor’? Quer dizer ‘amor’ como o oposto de ‘ódio’? Ou alguma outra coisa, embora, certamente, nenhuma palavra possa ser adequada para descrever ‘Deus’.


V: Não. Não. Pela palavra ‘amor’, certamente, não me refiro ao oposto de ‘ódio’. Refiro-me àquele amor que é a abstenção da discriminação entre ‘mim’ e o ‘outro’.

M: Em outras palavras, a unidade do ser?

V: Sim, sem dúvida. O que é então o ‘Deus’ a quem eu supunha orar?

M: Falaremos mais tarde sobre a oração. Agora, então, o que exatamente é este ‘Deus’ sobre o qual você está falando? Não é a própria consciência – o sentido de ‘ser’ que se tem – pela qual você é capaz de fazer perguntas? O próprio ‘eu sou’ é Deus. Que é o que você mais ama? Não é este ‘eu sou’ a presença consciente a qual você quer preservar a qualquer custo? A própria busca é Deus. Na busca você descobre que ‘você’ está separado deste complexo corpo-mente. Se você não fosse consciente, o mundo existiria para você? Existiria qualquer idéia de Deus? A consciência em você e a consciência em mim – são diferentes? Não são separadas apenas como conceitos que buscam a unidade não concebida que, por sua vez, não é outra coisa senão amor?

V: Agora entendo o que quer dizer “Deus está mais próximo de mim que eu mesmo.”

M: Lembre, também, não há nenhuma prova da Realidade exceto sê-la. De fato, você é ela, e sempre foi. A consciência cessa com o fim do corpo (e é, portanto, limitada pelo tempo) e, com ela, cessa a dualidade que é a base da consciência e da manifestação.

V: O que, então, é a oração, e qual o seu propósito?

M: A oração, como é geralmente entendida, é somente suplicar por alguma coisa. Mas, na realidade, a oração significa comunhão, união, Ioga.

V: Tudo está tão claro agora, como se um monte de escombros fosse repentinamente lançado fora de meu sistema, apagado da existência.

M: Quer dizer que você agora parece ver tudo claramente?

V: Não. Não! Não ‘parece’. É claro, tão claro que estou assombrado de não ter visto antes. Várias afirmações que li na Bíblia, que pareciam importantes, mas vagas, são agora claras como cristal – declarações como: Antes de Abrahão ser, eu era; Eu e meu pai somos um; Eu sou o que Eu sou.

M: Bem. Agora que você compreendeu, que Sadhana o fará obter a liberação de sua ‘escravidão’?

V: Ah! Maharaj. Agora você está certamente ridicularizando-me. Ou está me testando? Seguramente, agora eu sei que Eu Sou Aquilo – Eu sou, o qual sempre fui e sempre serei. O que resta fazer? Ou desfazer? E quem vai fazer isto? Para que finalidade?

M: Excelente! Apenas seja.

V: Sem dúvida, deverei ser.



Então, o jovem canadense prostrou-se diante de Maharaj – seus olhos cheios de lágrimas de gratidão e alegria. Maharaj perguntou-lhe se iria voltar novamente, e o jovem disse: “Honestamente, eu não sei”. Quando ele saiu, Maharaj sentou por um tempo com os olhos fechados e com o mais doce dos sorrisos em seus lábios. Então disse muito suavemente: “Alguém excepcional”; pude apenas entender as palavras.
Nunca mais vi o jovem canadense novamente e, às vezes, pergunto-me sobre ele."


De: "Sinais do Absoluto" - Pointers from Nisargadatta Maharaj - o 1° livro de Ramesh Balsekar sobre os ensinamentos do grande jnani. Futura publicação da Editora Advaita
http://editoraadvaita.blogspot.com/